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Coluna: “Pessoas perdidas”, de Cláudia Tajes

Andei perdendo pessoas nos últimos tempos — algumas por culpa minha, outras por circunstâncias: distância, mal-entendidos, desinteresse de ambas as partes, esquecimento, higiene. Perdas em vida talvez fossem possíveis de recuperar com uma mensagem simples ou até com um ato em desuso chamado de conversa cara a cara, um na frente do outro ouvindo, e dizendo coisas que doem. Triste é que, conforme o tempo vai passando, passamos a desconsiderar a importância que a pessoa perdida em vida teve para a gente. “Sério que um dia eu dividi tanto com ela?” Com a falta que a morte deixa, ninguém se conforma — já as faltas que surgem com a vida, essas são bem mais fáceis de serem aceitas.

Uma época belicosa como a nossa faz relações que pareciam firmes se desintegrarem por conta de opiniões que não combinam. Eu mesma já tomei “bola preta” de gente que considerava amiga e perdi a conta de quantos bloqueei nas redes sociais. Meu Facebook é hoje um bunker antirraiva em geral. Não que eu pense igual a todos os que ali estão, ou que eles sempre concordem comigo, mas os contras que mantenho são todos finos, elegantes e sinceros. Se é preciso admirar alguém para se relacionar — ou, ao menos, é necessário não desprezar — não há porque manter contato com os grossos e violentos. Vade retro!

Sobre os que vão embora por alguma situação que poderia ter sido contornada e não foi, esses acabam deixando um buraco no coração da gente. É diferente da implosão causada por amores que acabam, ainda que alguns considerem as grandes amizades mais fortes que a paixão. De qualquer forma, é diferente. Tenho me entristecido pelas pessoas perdidas, mas quando lembro do fim de amores, não sei como sobrevivi.

O primeiro de todos foi o mais dramático. Ainda por cima, inventei de curar as mágoas em São Paulo e fui assaltada logo na chegada. Passei duas semanas chorando na casa de um tio — sem trocar de roupa. Para dormir, me emprestavam uma camiseta de propaganda das balas Quebra-Queixo. Fase difícil. Quando enfim precisei lavar minha única roupa, vesti por dois dias uma camisa Volta ao Mundo que já devia ter uns vinte anos. Era de nylon, quente e desconfortável, não deixava o corpo respirar. As axilas vertiam água, o colarinho ficava sempre molhado. Não havia Chanel número 5 que desse jeito. Era como vestir um saco de plástico. Na fossa profunda e de Volta ao Mundo, não me admira que o fim daquele amor seja uma das minhas mais tristes recordações.

Se um dia eu tiver sabedoria para buscar minhas pessoas perdidas, vou juntar com todos as novas pessoas — por sorte — encontradas ao longo do caminho. Espaço para isso existe aqui nesse coração vivido, surrado e, tantas vezes, equivocado, mas que segue acreditando no poder curativo dos afetos.

Por Cláudia Tajes

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