Quem foi aluno no início dos anos 1980 da escolinha Esquilo Travesso, em Porto Alegre, deve lembrar da tia Lu. “Dizia que a fada ia chegar e me transformava numa. Era uma festa”. Alegre, opinativa e sonhadora, a jardineira-fada escolheu ser psicóloga. No final da mesma década, terminando o curso na Unisinos, a extrovertida Luciana Pavão Kroeff fez um estágio no colégio onde eu estudava, o João XXIII. Foi quando nos conhecemos, em algumas visitas que lhe fiz na salinha do SOE. A psicóloga-gata, de óculos e cabelos ondulados, circulava toda charmosa e chamava atenção no pátio do colégio no final da década de 80.
“Foram três anos trabalhando com adolescentes do Ensino Médio”. Em 1990, ela iniciou sua formação psicanalítica, quando já clinicava. Em 1994, aos 29 anos, casou e teve dois filhos: a estudante de psicologia Sofia, 18, e Alexandre, 12. Nesse período, também fundou a instituição psicanalítica Constructor, ao lado das colegas Elizabeth Guarmes e Beatriz Tuchtenhagen.
Neta do ex-deputado estadual Julio Teixeira, um dos pioneiros da praia de Jurerê, em Santa Catarina, Lu carrega também em seu DNA um traço político forte. “Foi ele que levou o Niemayer lá, para que este sugerisse um plano diretor para o balneário. O meu avô tinha uma imobiliária, que batizou de Jurerê e acabou dando o nome ao lugar”. Foi Lu uma das incentivadoras para que o ex-marido e pai dos filhos, Duda Kroeff, se candidatasse à presidência do Grêmio. “Ficar só na social de primeira-dama não era a minha cara. Criei e assumi o IGT, Instituto Geração Tricolor, que atende crianças e adolescentes em vulnerabilidade de 6 a 15 anos. A partir daí, foi natural virar gremista — mudou dentro de mim”. Ela ainda é sócia da Pousada dos Sonhos, onde moram a mãe e o irmão, em Jurerê.
A rotina agitada se divide entre os filhos e o trabalho de psicanálise no consultório e na Constructor, onde ministra seminários e dá supervisão para quem está fazendo formação psicanalítica. Neste ano, abriu o núcleo de psicanálise de crianças, que deve virar uma publicação impressa sobre o tema. E o que define Luciana?
“Faço o que sinto que tenho que fazer. Sou dona das minhas ideias e ideais”.
MB: O que faz teu olho brilhar como psicanalista?
LK: Meu olho brilha quando consigo resgatar as pessoas no sentido de elas buscarem o seu caminho, irem atrás dos seus desejos — não desperdiçarem vida, valorizando o coletivo, sem vaidade e ego. Quando consigo transmitir a ideia de que podemos compartilhar e viver em grupo.
MB: Por que nos atrapalhamos tanto emocionalmente?
LK: Porque temos uma cobrança de perfeição, beleza e performance que atrapalha. A vulnerabilidade é a grande potência que nos conecta com as nossas fragilidades e que nos faz mais solidários.
MB: Fale de maternidade.
LK: Temos que nos conectar com nossos filhos e saber frustrá-los também. O desafio é estar perto, acompanhá-los e, ao mesmo, trabalhar e curtir a vida como adultos. Muitos adultos ficam culpados de estar longe dos filhos e, por culpa, acabam não conseguindo frustrar os filhos.
MB: Um segredo de bem viver?
LK: Não fazer julgamentos precipitados e saber se colocar no lugar do outro. Entender que as pessoas são diferentes e acolhê-las no coração. Não se sentir ofendido ou levar para o pessoal.
MB: Fale deste momento da vida.
LK: Estou muito feliz! Em um momento de liberdade para valorizar as minhas escolhas. Em um relacionamento muito especial e diferente de tudo o que já vivi.
MB: Defina-se.
LK: Sou abnegada, persistente, obstinada, sonhadora, idealista e otimista. Preciso de ilusão. Acreditar em um mundo melhor. Isso me move.
MB: As mulheres estão mudando?
LK: Estão acordando. Acho que, hoje, são mais amigas entre si, mas ainda temos medo de sermos julgadas. O trabalho e o salário ainda têm diferença, mas a maneira de encarar a sexualidade ainda é a diferença maior. As mulheres não ousam mais por medo.
Por Mariana Bertolucci.