Por memória. Por justiça. Que não se repita. Essas palavras são ditas pelos familiares das vítimas do incêndio da Boate Kiss. Tanto na vida real quanto na série Todo dia a mesma noite, da Netflix, que estreou em 25 de janeiro.
E se há alguma relevância e necessidade em relembrarmos essa ferida aberta em Santa Maria, no Rio Grande do Sul e no Brasil todo, eu atribuiria a essas razões. Por memória. Por justiça. Para que não se repita.
Certa vez um professor perguntou por que estudamos história. “Para conhecermos o passado”, alguém palpitou. “Para sabermos de onde viemos”, outro tentou adivinhar. “Para entendermos por que o mundo é como o conhecemos?”, um terceiro intuiu. A resposta correta, no entanto, era outra.
“Para não cometermos os mesmos erros”.
Todo dia a mesma noite é baseada no livro de mesmo nome, da jornalista Daniela Arbex. A série deveria ter sido feita? A forma como os fatos são mostrados é correta? As famílias deveriam apoiar a produção ou se revoltar contra ela?
Diferentemente da pergunta do professor de história, não existe uma resposta que eu considere que seja a correta.
Seria insensível e pretensioso demais, aliás, afirmarmos qualquer coisa com algum nível de certeza quando há familiares de 242 vítimas fatais. Que têm suas próprias vozes e cujas reações e opiniões sobre as obras em torno do incêndio da boate Kiss precisam ser respeitadas, jamais questionadas.
No meu lugar de espectador, contudo, fico com o que de “positivo” (entre muitas aspas) podemos atribuir à série: a memória.
Um exemplo disso é que, quando a tragédia aconteceu, não sei se eu estava desatento ou se apenas não lembro. Ou se nem todos os fatos foram superexpostos como realmente deveriam. Mas muita informação que Todo dia a mesma noite traz, de tão absurdas e revoltantes, soam como novidades. Como, por exemplo, as irregularidades da boate, as omissões das autoridades e o empenho de algumas instituições em impedir que a acusação chegasse a todos os responsáveis.
E como a humanidade pode não cometer os mesmos erros sem conhecer sua história? De que forma nos revoltaremos com injustiças sem que elas sejam lembradas? De que maneira novas gerações saberão do que aconteceu?
Há uma fala entre dois personagens de Todo dia a mesma noite que me lembrou muito a pergunta do professor de história: “Memória e justiça andam juntas”. Ou algo assim. E, se for para relembrar esta e outras tragédias, que seja por essa razão. Por memória. Por justiça. Que não se repita.
Bá Experiência por Diogo Zanella/Estúdio Telescópio
A coluna Bá experiência é produzida pela agência de design e conteúdo Estúdio Telescópio.
Esta semana, no podcast Bá que papo, conversamos com Mariana Job, uma das atrizes da série. Para ouvir o episódio no Spotify, clique aqui.