No ano 2000, com 11 anos, pela primeira vez, fui a uma sala de cinema. Uma idade tardia para debutar em frente à telona, mas não tive oportunidade de ir antes.
Assisti, com meus pais e minha irmã, O Auto da Compadecida. Um dos meus filmes favoritos. Mas o que eu mais gosto, entre todos, aquele que chamamos de filme da vida, é Central do Brasil. Ambos nacionais. Ambos com a Fernandona (leia-se Fernanda Montenegro).
Em 2004, assisti no cinema ao filme Olga, inspirado na biografia de Olga Benário Prestes — interpretada pela maravilhosa Camila Morgado — e que tem, mais uma vez, a Fernandona no elenco. Eu estava no que chamávamos de 8ª série do Ensino Fundamental, e lembro de contar aos meus colegas o quanto eu tinha me impressionado com o longa. Fui zoado. “Tu assiste filme brasileiro?”. “A neve era feita de isopor?”.
Uma tia, a Beti, irmã de meu pai, sempre foi noveleira. Ela costumava falar, orgulhosa, que nós, brasileiros, sabemos fazer novela. São as melhores do mundo. Cinema não. Filme quem sabe fazer são os americanos.
Seguimos desvalorizando o cinema nacional hoje? Espero que não. Assim como espero que possamos, cada vez mais, conhecer a nossa própria história.
Ano passado, estreou no cinema o longa-metragem O Sequestro do Voo 375, dirigido por Marcus Baldini. O filme, inspirado em fatos reais, é sobre o dia em que Raimundo Nonato Alves da Conceição entrou em um avião da Vasp, armado, para arremessá-lo contra o Palácio do Planalto e assassinar o então presidente José Sarney. O piloto Fernando Murilo fez manobras arriscadas para tentar deter o sequestrador, chegando a deixar a aeronave de cabeça para baixo.
Esse caso, após a morte do terrorista Osama bin Laden, em 2011, ficou conhecido como 11 de setembro brasileiro. Isso porque, no local onde ele foi assassinado, foram encontradas páginas de jornais com reportagens sobre o sequesto do voo da Vasp. Bin Laden, portanto, poderia ter estudado o sequestro no Brasil antes dos atentados às torres gêmeas. O mais chocante de tudo isso, fora a situação em si, é que, assim como eu, muita gente não conhecia esse episódio.
Conclusão 1: além de não valorizarmos o cinema e a cultura brasileira, no geral, não conhecemos nosso próprio passado recente e os nossos heróis.
Conclusão 2: nós temos muitas razões para se orgulhar do cinema nacional. Quem assistiu ao Sequestro do Voo 375 sabe disso. É extremamente bem feito, com um roteiro que desenvolve a trama de forma envolvente e explora a profundidade dos personagens. É muito bom. Mesmo.
Conclusão 3: meus colegas e minha tia estavam errados. Para eles, nada a declarar, nunca mais os vi. Para a tia, digo o seguinte: brasileiro sabe mesmo fazer novela. E cinema também.
Um salve ao cinema nacional.
No podcast Bá que papo desta semana, recebemos Marcus Baldini, o diretor do filme O Sequestro do Voo 375.
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Bá experiência por Diogo Zanella/Estúdio Telescópio