Bá experiência por Diogo Zanella/Estúdio Telescópio
Volta e meia, quando o assunto é novela, alguém fala sobre o curioso fascínio que as vilãs despertam.
Alguns as acham mais atraentes e interessantes. Outros as consideram mais carismáticas. Quase todos as preferem. Mas, afinal, por que elas costumam ganhar um espaço cativo no nosso imaginário?
Minha aposta para justificar tamanho magnetismo seria por elas serem extremamente sedutoras. E, justamente por isso, perigosas.
Claro que, em se tratando de ficção, a fantasia nos permite amá-las muito mais que odiá-las. Até porque o perigo ali representado não cruza a fronteira do ‘faz de conta’ para invadir a vida real. O que também não nos exime de questionar nosso lado humano obscuro e sádico, através do qual permitimo-nos amar Carminhas, Zoés e Nazarés da vida.
No último sábado, dia 15 de julho, assisti ao espetáculo Quando eu for mãe, quero te amar desse jeito: uma comédia cheia de veneno. No elenco, Rafael Sardão, Marta Paret e, a diva, Vera Fischer. Eu sabia se tratar de uma sátira das batalhas travadas entre mães e noras. Só não esperava uma sogra tão vilanesca, interpretada pela Vera. Divertida. Apaixonante. Sedutora. Perigosa.
Mas, por incrível que pareça, não foi a peça com a Vera Fischer que me fez pensar sobre as vilãs de novela e o nosso amor por elas. Quem me fez recordar das Carminhas, Zoés e Nazarés, pode acreditar, foi a Marlene Mattos.
Ao acompanhar os trechos de Xuxa, o documentário, e ao assistir às entrevistas de divulgação que a rainha dos baixinhos deu, o Rodrigo, meu marido, logo disparou: “nossa, parece uma vilã de novela. Nem parece real”.
Isso não é uma carta em defesa da Xu.
Primeiro, porque precisamos considerar o contexto da Marlene Mattos sendo uma mulher, à frente da direção de um programa nos anos 1980, em um ambiente dominado por homens. Um universo ao qual ela dificilmente sobreviveria sem se impor e até se masculinizar para ser respeitada. Segundo, porque é evidente que uma obra, seja documental ou dramatizada, ao ser encabeçada pela própria celebridade cuja história é contada, sempre será enviesada. Para não dizer chapa-branca.
Contudo, focando no caso Xuxa e Marlene Mattos, foi bastante chocante conhecer aquela figura tão polêmica e enigmática. Que chega até a flertar com a canastrice se a entregássemos o papel dado por parte do público: a vilã. Tal qual as Carminhas, Zoés e Nazarés.
E o comportamento dela no documentário só favoreceu o lado vítima de Xuxa. Vítima de assédio moral, abusos e, eu diria, violência emocional até.
Foi chocante também ver quanta gente ficou do lado da diretora. Nomes como Mara Maravilha e Antônia Fontenelle, tudo bem. O que me surpreendeu foi figuras carismáticas, como a da Deborah Secco, que supostamente, por um comentário no Twitter, demonstrou estar do lado da Marlene Mattos também. Eu não fiquei do lado de Marlene nessa história. No entanto, tenho alguns panos pra passar.
Além do que já mencionei, sobre ser uma mulher diretora de TV nos 1980, a pressão que Marlene Mattos fazia sobre a vida da apresentadora era uma pressão que ela recebia também. Xuxa era um produto de bilhões de reais, e que por isso não poderia ter um arranhão sequer em sua imagem. E a responsabilidade sobre isso caía sobre os ombros de quem? Pois é, veja só, a Marlene Mattos.
Essas circunstâncias são tão complexas de serem avaliadas de fora que Xuxa, o documentário passou a girar em torno dessa questão, Xuxa versos Marlene Mattos. O grande clímax que o público espera, sem dúvida, é o reencontro entre as duas. A eterna rainha dos baixinhos e aquela que teria sido seu algoz. Ou não.
Comecei este texto falando sobre como amamos as vilãs. Lembrei das vilãs de novelas porque foi esse o gatilho que Marlene Mattos despertou em mim e no Rodrigo. E, agora, olha eu aqui, finalizando quase a defendendo. Se ela realmente foi a vilã da história, acho que fui seduzido.
Esta semana, no podcast Bá que papo, recebemos o Fábio Garcia, do canal Coisas de TV, para falar sobre o documentário da Xuxa, e Marlene Mattos. Aproveitamos para comentar, dentre outros assuntos, a novela Terra e Paixão.
Ouça agora no Spotify clicando aqui. Para ler outros textos da coluna Bá experiência, acesse este link.
Bá experiência por Diogo Zanella/Estúdio Telescópio