Chapa branca é uma expressão utilizada para caracterizar biografias autorizadas que servem aos interesses do biografado, e não ao interesse público ou à verdade. Ou, então, aos interesses da família que autorizou a obra, se a pessoa em questão já morreu. Esse termo tem origem no jornalismo.
No modelo antigo de identificação de veículos, todos os carros oficiais de órgãos públicos tinham placas na cor branca. Aos veículos de imprensa que publicavam somente o conveniente para governos e autoridades, portanto, foi dado o apelido de chapa branca.Veículos de imprensa chapa branca não têm compromisso com a verdade, nem o menor comprometimento com a função primordial do jornalismo: separar o joio do trigo. E publicar o joio. Gosto muito desta frase. Ela é de Mark Twain, pseudônimo do jornalista norte-americano Samuel Langhorne Clemens, que faleceu em 1910.
E se uma imprensa sem interesse em informações não oficiais, em investigações independentes e em verdades não convenientes é chapa branca, uma biografia — ou cinebiografia — com as mesmas características, claro, também é. Faz sentido. Como a recente Back to Black, sobre a trajetória da eterna Amy Winehouse.
Se quiser ter ideia de quem foi Amy Winehouse, e como o desfecho trágico de sua vida tem raízes em traumas da infância a partir da separação de seus pais, não assista ao Back to Black. Se quiser entender como seu pai, Mitchell Winehouse, foi responsável pelo fracasso de Amy no tratamento dos vícios, não assista ao Back to Black. Se quiser compreender de onde veio o comportamento autodestrutivo, as referências na música, o amor pelo jazz e a admiração por Tony Bennett, não assista ao Back to Black. Se quiser sentir a essência de Camden Town, último bairro onde ela morou, não assista ao Back to Black. Assista ao documentário Amy, de Asif Kapadia, vencedor do Oscar de melhor documentário de longa-metragem.
Mas, se quiser ter um exemplo de cinebiografia chapa branca, aí sim, assista Back to Black. O produtor do filme é o Mitch Winehouse, pai de Amy. Que, além de aprovar o roteiro, foi o responsável pela escolha da atriz que interpreta a filha (a atriz escolhida foi Marisa Abuela). O mesmo pai que fez a filha se apresentar em diversos shows mesmo sem ela estar em condições físicas e emocionais.
Não é difícil de entender, embora seja ainda assim decepcionante, por que o longa-metragemé raso, não condizente com a realidade e parece suavizar ou distorcer determinadas situações e personagens. Lembra da frase que comentei sobre o jornalismo ter a função de separar o joio do trigo e publicar o joio? Back to Black publica o trigo. Ou seja, chapa branca.
Esta semana, no podcast Bá que papo, comentamos os tantos erros cometidos pelo filme Back to Black, que se propõe a ser uma cinebiografia do mito Amy Winehouse. Para isso contamos com a presença do Rafa Colombini, do Instagram @pop.cout. Ouça agora no Spotify clicando aqui. Para ler outros textos da coluna Bá experiência, acesse este link.
Bá experiência por Diogo Zanella/Estúdio Telescópio