Quem é de Porto Alegre completa quase instantaneamente o título deste texto com a frase “nas ruas de um Porto não muito Alegre”. Letra da música Horizontes, composta por Flávio Bicca Rocha para a peça Bailei na Curva. Um clássico.
A canção começa falando de uma cidade não muito feliz. Mas a continuação traz um alento. “E que, no entanto, me traz encantos. E um pôr de sol me traduz em versos.”
Eu também sinto a capital menos animada. E não é uma crítica. Até porque, como se sabe, Porto Alegre está se apropriando de uma vocação que sempre teve: o de cidade com potencial turístico. Com o peito aberto para o Guaíba e o seu pôr do sol.
Quando falo de um Porto não muito alegre é pelo olhar de quem não é frequentador da noite como antes.
A forma mais autêntica de vivenciar o potencial alegre de uma cidade é a conhecendo pela sua vida social noturna. Por isso, quando deixei de frequentar a noite passei a achar as coisas menos animadas. Além disso, tem outra questão. Os lugares terminam. Fecham. Deixam de existir.
Há muito tempo que ando nas ruas de um Porto sem Laika, Beco, Astro, Casa do Lado. Sem Cine Theatro Ypiranga, Refugius, Cord, Neo. Todas essas casas noturnas foram importantes pra mim, e eu nunca mais terei a oportunidade de estar nelas novamente. Existiram e simplesmente ficaram restritas a lembranças, fadadas ao esquecimento trazido pelo tempo.
É isso que me traz a sensação de um Porto não muito alegre como antes. Gostaria de saber, inclusive, se isso acontece em outras capitais ou se as casas noturnas acabarem é uma particularidade da nossa cidade.
Assim como é entoado na música Horizontes, depois da saudosa lista de boates que eu ia e que fecharam, também tenho um “que no entanto”. Falo dos lugares que resistem às décadas e já se tornaram multigeracionais. Como o Ocidente. O Bar Opinião. O Venezianos. E, que recentemente completou 30 anos de história, o Cabaret.
O “Caba” passou por percalços. Em 2013, ano da tragédia na Boate Kiss, em Santa Maria, o Cabaret também foi vitimado por um incêndio. As chamas começaram entre o forro e o telhado. Felizmente, a casa estava fechada, e os danos foram estritamente materiais.
O Caba, da Avenida Independência, descendo a esquina do Bambu’s. Do cara que “morava” embaixo da escada e pegava os pés de quem subia para o outro andar. Uma lenda da noite.
Depois de ser consumido pelo fogo, passaram-se dois anos até reabrir em outro endereço, no Centro de Porto Alegre. E depois teve a pandemia. Mas o Cabaret, que começou como uma casa de MPB; festas anos 1970 e 1980; e rock, resistiu. O Cabaret, que apresentou para muitos o indie e abraça todas as tribos desde sempre, permaneceu. O Cabaret, que hoje traz também festas de pop e funk, sempre envolvendo os mais variados públicos, segue firme.
Não é todo dia que um lugar icônico da noite porto-alegrense chega ao marco de 30 anos. Por isso, no podcast Bá que papo desta semana, chamamos um dos produtores e djs mais antigos e importantes da casa: o Zu. Confere lá.
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Bá Experiência por Diogo Zanella/Estúdio Telescópio
Que belo texto, adorei!