Em uma reunião virtual de trabalho esta semana, enquanto falávamos sobre diferentes frentes de ajuda às vítimas das enchentes que assolam o Rio Grande do Sul, algo foi dito e me chamou atenção.
Neste momento, disse alguém, se não fizermos nada, poderemos ser criticados. E se fizermos algo, também. Essa pessoa afirmou isso por conhecer gente que fez doação a desabrigados, exibiu nas redes sociais e foi julgada; acusada de se promover. Naquele discurso “se ajudar, precisa mostrar?”
Jamais imaginei que isso seria uma discussão oportuna na situação dolorosa como esta pela qual estamos passando. Mas está sendo.
No dia 3 de maio, Luciano Huck chegou a publicar um vídeo cuja chamada era “A maior tragédia do estado”. No dia 5 de maio, porém, postou uma foto ao lado de Madonna. Nesta data, como se sabe, o Rio Grande do Sul já vivia um cenário desolador. Pelo tom otimista da publicação com a cantora, o apresentador foi duramente criticado. No dia 12 de maio, ele teve sua doação de 1 milhão de reais exposta em seu programa dominical e, no dia 14, visitou um abrigo onde estão dezenas de famílias desabrigadas. Foi acusado de oportunista.
Em uma matéria publicada em 06 de maio no site da IstoÉ, está a chamada: “Cade o Neymar?’Jogador é cobrado nas redes sociais sobre doações ao Rio Grande do Sul”. Na manhã do dia 7, o futebolista contou nas redes sociais que ajudou as vítimas das enchentes. No dia 14 de maio, Luísa Sonza, em seu Instagram, criticou famosos que, na interpretação dela, estariam utilizando o desastre no Rio Grande do Sul para “se autopromover”; e revelou estar ajudando. Paradoxal.
Só para finalizar: Pedro Scooby foi acusado de “querer aparecer” ao vir para o estado; e William Bonner foi hostilizado enquanto entrava ao vivo para o Jornal Nacional. “Cadê a Globo dentro da água? Tem empresário do Brasil trabalhando mais que o presidente. Por que a Globo só veio agora gravar? Por que não teve ninguém dentro da água antes? Por que vocês não estiveram com a gente dentro desse resgate? Na hora de botar na mídia é fácil. Depois que está tudo seco é fácil vir falar. Eu quero entender por que o povo de Porto Alegre, o estado do Rio Grande do Sul, o Brasil inteiro está ajudando e aí aparece o pessoal agora para gravar. Esse serviço lixo!”.
Parei por aqui. Se você sentiu ansiedade e achou este texto um show de horrores e extremamente pessimista, não pense que me alegra escrevê-lo. Ao contrário, queria eu ter me poupado de pensar sobre tudo isso. Para um alento depois de tanta pedrada, sei que a catástrofe movimentou ações de solidariedade em todo o Brasil e que foram muitos os exemplos do povo que esteve na linha de frente e salvando vidas.
No entanto, não é uma loucura que em meio a isso tenhamos que despender energia também para lidar com o julgamento? Se não ajuda, é cobrado. Se ajuda e mostra, é julgado. Se a imprensa não cobre, é omissa. Se cobre, é oportunista.
Eu, inclusive, neste momento, entrei na paranoia. “Vão me detestar por vir com este papo chato”, pensei. O tipo de reflexão que me proponho, afinal, pode até não ser muito esperançoso e ser mais “colocador de dedo na ferida”. E talvez isso não seja o que as pessoas desejam ler. Mas, no meu entender, é que julgo ser necessário. Ainda que você ache desnecessário.
No podcast Bá que Papo desta semana comentamos como estão as nossas vidas em meio ao caos, de que formas podemos ajudar e como enxergamos o futuro. Sairemos dele? Existem culpados? Podemos mudar o presente? Ouça agora no Spotify clicando aqui. Para ler outros textos da coluna Bá experiência, acesse este link.
Bá experiência por Diogo Zanella/Estúdio Telescópio