Finalmente terminei de ler um livro que pode, com tranquilidade, ser lido em um fim de semana. Só que eu fui procrastinando. A leitura estava promovendo um turbilhão em mim por causa de estudos em que estou me aprofundando. O livro, escrito por um agente aposentado do FBI, apresenta algumas técnicas de persuasão. Tudo parece tão simples!
A leitura me fez reviver algumas histórias marcantes da minha vida. Analisando de fora, meu Deus! Estava tudo tão claro, e eu não vi! Não fui capaz de perceber! Que tonta! Quem nunca?!
Enquanto falava com algumas pessoas, ficava me perguntando se ela estava tentando usar algum subterfúgio que li no livro; queria saber, ainda, se estava fazendo isso de forma consciente ou não. Muitos nós na cabeça até me dar conta de que estava analisando cada palavra e gesto do meu interlocutor.
Às vezes sequer tinha interlocutor. Um dia, deitada vendo um filme, me deu uma vontade monstra de fumar um cigarro. Aí racionalizei: será que realmente quero fumar ou foi só uma vontade passageira? Pronto, nessa dúvida passaram-se alguns segundos, e lá sei foi a vontade (fumo algumas vezes, por falta total de vergonha na cara, porque fico superbem sem cigarro).
Descobri que posso controlar algumas vontades não pela força ou repressão, mas pelo pensamento. Veja só que descoberta! Então levei isso para várias situações do meu dia e me flagrei em outro gatilho que o livro gerou e que acabou potencializando uma agonia muito particular (imagino eu!).
Poucas coisas me irritam mais do que um “mas” mal colocado. Muda todo o sentido de uma frase e mesmo de um contexto. Bem empregado, porém, é riquíssimo. Tem um outro “mas” que me incomoda mais: o dito mil vezes por dia e que esconde tantas e tão profundas camadas do nosso inconsciente. Vou tentar explicar com exemplos.
A viagem que fiz à Bahia no carnaval estava maravilhosa, “mas” teve… Frustrante para quem ouve ou lê! A lista do Oscar é perfeita, “mas” falta… Ou é uma coisa E outra. Ou não é a primeira coisa! Ou foi maravilhosa, com alguns perrengues; ou não foi legal. Qual o mal de dizer que não foi legal? Por que não posso simplesmente ver a parte que foi muito boa e fazer ela ser a lembrança mais forte e presente da viagem? Será que a gente se boicota inconscientemente todo o tempo? Ou será que estamos numa busca do perfeito, do inalcançável?
Lembrei de uma fase da minha vida em que não lembro muito o que eu fazia, mas lembro de minha mãe dizendo para alguém de quem também não me lembro: “a Flávia está em estado de graça”. Quero voltar àquele estado assim que possível e por um longo tempo, porque deve ser bom demais esse estado. E, depois, (não “mas” depois), quem sabe, chego ao “ser” graça todo o tempo!
O livro que despertou tudo isso é do John R. Schafer: “Manual de persuasão do FBI”. O próprio título do livro já usa persuasão: FBI
Quero aqui dizer que em situações como a que vimos na Espanha, com o jogador Dani Alves, um MAS faz toda a diferença. “Ela não disse não”, ele alegou. E se a frase fosse: ela não disse não, MAS (também) não disse sim.
Por Flávia Moreira, jornalista