O mais recente livro da escritora Fátima Farias, Palavras são mudas (Editora Libretos, 2024, R$ 40), é uma preciosidade. Trabalha a palavra poética, entre várias abordagens, por uma das questões cruciais que persegue os fazedores de versos: o silêncio. Misturando temperos de sua cozinha literária, a autora ainda fala de negritude e do feminino sem ser panfletária. O resultado é um lirismo arrojado e novo desta gaúcha de Bagé, que leva no currículo também os livros editados pela Libretos, Mel e dendê (2020) e Santas de casa (2023).
Além da literatura escrita, Fátima também é compositora de sambas de raiz. Observe-se os versos do poema homônimo ao título: Caem distraídas no prato palavras diversas/misturam-se ao molho/se perdem entre tomates, alhos/sal, repolho, azeite e alface.//O feijão sorri apetitoso/preto e lustroso, no charme natural da vida.//Rebentos brotam na ponta da língua apimentada/enquanto um til goteja feito chuva tímida/encaixando feito luva, negando afirmação./Traços, vírgulas, pontos e reticências/são engolidos com o caldo na canja.//Palavras, palavras precisas, sucintas//provocadoras, sinceras/fiéis afagos, cortantes lâminas inflamando de forma natural/a ponta dos dedos disponíveis da poeta.
No poema, apenas para citar um exemplo, a autora maneja a faca da linguagem de modo criativo. Parte do mundo culinário ao qual é mestre para misturá-lo à palavra lírica, cortante lâmina como a de João Cabral, que inflama as pontas dos dedos disponíveis a poeta. Outro verso, agora falando de negritude mistura o corpo à linguagem e também à religiosidade: Meu corpo é um Quilombo/que abriga linguagem, idiomas, etnias e danças/destranca portas/desamarra nós/desentrava cadeados, derruba muros/com palavras que são murros na força da verdade.//Sou um Quilombo Corpo Negro/em busca da tão sonhada liberdade!
Fátima é expert no arranjo dos alimentos que saciam o espírito e aprendeu na prática da gastronomia os segredos da alquimia, transposto de modo exemplar para a literatura. Suas palavras são brotos de esperança e de força de uma mulher negra e que não vem do centro habitual da intelectualidade. Sua voz merece ser ouvida e jamais, calada.
Susana Vernieri, jornalista, escritora e poeta
Enorme satisfação ver meu trabalho sendo representado por uma excelente profissional.
É trabalhoso chegar aqui, porém prazeroso da mesma forma.
As parcerias que encontro pelo caminho sa o a prova da força do coletivo. Andar só, não nos leva a lugar algum ou leva? Na minha opinião não.
Temos muito trabalho pela frente.
Muito obrigada Susana, muito obrigada #editora libretos.
Obrigada por nos lerem.🥰😍
Embora eu que escrever deste meu lugar
A Fatima Farias é tudo isso mesmo. Belo texto, querida Susana!